segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Ansiedade

O relógio faz barulho. Tique, taque, tique, taque, tique, TAque, TIque, TAque, TIque, TAque, TIQUE, TAQUE, TIQUE, TAQUE, TIQUE... A cabeça está pesada. Nada tem graça. Ler um livro? Falta concentração. Ver um filme? Demorado demais. Escutar música? O som do relógio já é suficientemente enlouquecedor. Olhar para ele é pior. As horas passam rápido o suficiente para que o tempo seja todo desperdício, mas devagar o suficiente para que o momento aguardado não chegue. As mesmas frases, os mesmos memorandos, são repetidas inúmeras vezes, escondidas na cabeça ansiosa. Destruidoras, destruindo a cabeça ansiosa. Destruindo o corpo ansioso, que não responde. Não se mexe. O peito fica pesado, a respiração irregular: tédio!
 
Há pessoas que morrem de doenças do coração. Outras, de doenças respiratórias. Outras, de doenças cujos nomes causam medo. Mas poucas mortes - talvez nenhuma - são tão assustadoras quanto a vida da pessoa ansiosa. Vida difícil, onde cada pequena ação, tão simples aos olhares alheios, é uma vitória homérica. E cada vitória a certeza de que a próxima vez não será tão fácil, pois a ansiedade vai piorar. Sempre piora. Só piora.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

RPG

À noite, cabeça no travesseiro. Jogo salvo? Sim, mas é impossível voltar. Este role playing game é um pouco mais complexo. Seus personagens têm apenas uma vida, compartilhada por todos eles. A morte é permanente. O fluxo do tempo, irreversível. Quando você coloca a cabeça no travesseiro, não importa qual personagem esteja incorporando, você salva e segue em frente, comemorando ou sentindo muito as suas escolhas. Não apenas as escolhas que fez hoje, ou ontem, ou semana passada. Mas também - ou, normalmente, apenas elas - as que vocês fez há cinco ou dez anos atrás.

É, este jogo é assim. De tempos em tempos, são dadas duas opções de escolha. E você escolhe, praticamente às cegas. Geralmente, você escolhe errado. Aí você continua jogando, um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez anos... E eis que, finalmente, aparece o resultado da escolha. Sem que você perceba, o resultado alimentou-se da sua decisão errônea todo esse tempo e revela-se fazendo estrago, já indestrutível. Neste RPG, os resultados de suas escolhas são sua meta e seus inimigos. Eles atacam com precisão, sempre acertam seu coração. E dói. E matam. No fim das contas, sua vida exterminada, você percebe, seguindo a luz no fim do túnel, que tudo poderia ter sido melhor. Fazer o quê? O jogo está salvo, mas é impossível voltar.