Quando criança, amava viajar para a casa de meu tio com meus avós para jogar video game e montar LEGO. Minha prima tinha um Master System, enquanto eu não tinha console algum. Ela também tinha sets lindos do bloco de montar mais famoso do planeta. Eram casas, carros, barcos, todos naquele estilo aconchegante que os modelos dos anos 1980 exibiam. Em cada uma das manhãs de cada um dos dias daquela semana que só acontecia uma vez por semestre, eu contava as horas para acordar e começar a brincadeira.
Foi meu tio quem me apresentou várias coisas das quais sou fã até hoje. Além do Master System que já citei, e, obviamente, dos jogos da Sega, foi ele quem me apresentou o personagem Astérix dos quadrinhos franceses. Foi ele quem me apresentou o Sítio do Pica-Pau Amarelo de Monteiro Lobato. Foi ele quem me apresentou o hóquei de ar. E foi meu tio quem me apresentou aquele que me abriria os olhos para como jogos de tabuleiro podem ser emocionantes, proporcionando experiências que nenhuma outra mídia pode proporcionar.
Certa tarde, ele conseguiu reunir toda a família ao redor da mesa e, julgando que todos ali já tinham atingido idade adequada para tornarem-se estrategistas militares, desceu o seu War de cima do guarda-roupas, abriu a caixa, montou o mapa, e minha boca começou a salivar. Empolgadíssimo, recebi meus territórios e meus exércitos como se realmente estivesse supervisionando minhas tropas que marchavam para minha inspeção em minhas terras, que governava com inteligência e punhos de ferro.
Lembro que a partida durou horas, a tarde toda. Não fiquei entediado nem por um segundo. Assistia aos embates entre os outros generais com a mesma empolgação com que rolava meus dados. Tudo era verdade. As batalhas, os territórios, as missões. A estratégia tinha que ser muito bem planejada, as vidas de meus soldados estavam em minhas mãos! Ainda assim, aceitei a derrota quando ela veio. E olhei para o mapa uma última vez naquela tarde, analisando quais territórios haviam sido anexados pelo vencedor, imaginando que tipo de realidade os cidadãos dele viveriam a partir de agora. E lá se foi o tabuleiro para o guarda-roupas. E cá veio uma vontade enorme de viver outras emoções... Naquele Interpol, como será perseguir o Mr. X? E neste Combate, quem será o último a cair? Nascia uma paixão.
domingo, 30 de janeiro de 2022
Amor à Primeira Vista
quinta-feira, 20 de janeiro de 2022
Como a Internet Fez do Cinema Pipoca um Poço de Mesmice
Antes da virada do século, a informação seguia por vias mais lentas, bem mais lentas, do que aquelas que percorre hoje. Tínhamos revistas impressas, jornais impressos, telefones. Se um filme era sucesso, o boca-a-boca fazia com que ele permanecesse semanas nas salas de cinema. Se fosse ruim, levava um tempo até a galera conseguir explicar o porquê, pois os ouvidos estavam atentos, mas as vozes críticas nunca chegavam a tempo... E, ainda que chegassem, ou quando chegavam, já estavam distorcidas por números de bilheteria e decisões da mesa de diretores dos grandes estúdios.
Sim, estes mudavam os rumos de suas séries mais lucrativas segundo as opiniões do grande público. Mas como a informação chegava até eles na palavra pasteurizada dos críticos dos grandes veículos de imprensa, as mudanças eram igualmente pasteurizadas. Batman Returns lucrou pouco porque era demasiadamente sombrio? Então Batman Forever será super colorido, mas toda a narrativa dos filmes anteriores será mantida.
Hoje, a informação é imediata. A internet nos deu este poder. Se um filme é bom, ou se um filme é ruim, sabemos no dia do lançamento. Ou melhor, sabemos um dia antes, logo após as prévias. O problema é que bom e ruim são qualidades subjetivas - especialmente quando tratamos de narrativas, de filmes, de arte em geral. Claro, a crítica especializada pode nos dizer se um filme é tecnicamente bom, se tem um roteiro bem trabalhado, uma fotografia que casa com este roteiro, uma trilha sonora que não atropela esta fotografia, uma direção de atores que não desmente esta trilha... Mas isto não significa que todos irão gostar do filme em questão. Ou seja, ele não será bom para qualquer um. O público menos culto pode igualmente ir à loucura com uma continuação muito desejada que seja tecnicamente sofrível, mas que entregue justamente aquilo que os pagantes queriam. É filme ruim? Para o crítico, sim. Para quem saiu contente da sala de cinema, não.
Quando o grande público abomina um filme, a internet grita. Balança. Sacode. Os engravatados dos estúdios sentem-se até intimidados. Instantaneamente. Não no dia do lançamento do filme no qual investiram dinheiro e suor, mas um dia antes. O dia de ontem. O filme já é um fracasso antes de sair. Começam as demissões, os replanejamentos, as mudanças de foco. Afinal, cinema pipoca é isso: sede de sequência. Sequência is money.
Ok, a série muda de rumo, as sequências agradam a todos, todo mundo sai ganhando. Certo? Aparentemente sim, mas na verdade existem duas vítimas aí: a arte e o autor. No mundo da informação instantânea, e do cinema pipoca bilionário, um twitter ou um youtuber influentes podem destruir anos de planejamento de um autor dedicado, que traçou uma narrativa pronta para abranger vários filmes, num crescendo de emoções que vai transformar os personagens de maneira relevante. Quando esta narrativa tão tenazmente trabalhada gera polêmicas, a série é reformulada ainda em andamento, o autor perde sua voz, e a obra que poderia ter grandes méritos artísticos esvai-se numa poeira de mediocridade. Testemunhamos dois casos grandiosos onde tal fato ocorreu, ambos com consequências desastrosas: o DCEU com sua Liga da Justiça e Star Wars com seu Episódio IX.
No caso do DCEU (Universo Expandido DC Comics), o diretor Zack Snyder estava à frente de todos os principais episódios da saga, mas entregou um segundo capítulo tão violento e complexo, que o estúdio o afastou do terceiro capítulo, o filme da Liga da Justiça. Em 2017, estreou uma aberração que pouco tinha de Snyder e pouquíssimo tinha dos filmes anteriores. Uma minoria conseguiu fazer tanto barulho que a versão do diretor saiu em 2021, mas o estrago estava feito. O que poderia ter sido o primeiro filme bilionário de super-heróis com um protagonista negro acabou com tal protagonista reduzido a poucas cenas e uma narrativa sem pé nem cabeça. A versão de 2021 é ~o filme~ do ano passado, e um dos melhores filmes de super-heróis já lançados. A versão de 2017 fez o DCEU transformar-se numa cópia sem-vergonha do Universo Marvel.
No caso de Star Wars, Rian Johnson preparou um Episódio VIII corajoso, inspirado e completamente inovador. Enquanto o episódio anterior encostava na nostalgia e nela repousava tranquilamente com um cobertor de dólares verdinhos, o episódio de Johnson transformava velhos protagonistas em idosos amedrontados e um universo de conforto num festival de surpresas, e, assim, colocava uma mitologia inteira em perspectiva. Não é um filme perfeito, mas seu valor artístico é inegável. Um grupo de fãs da saga com uma visão bem estreita do que pode ser aceito como Star Wars fez um barulhão tremendo, a bilheteria sofreu um baque e o resultado é o nono episódio, que, novamente usando do fator nostalgia como muleta, entregou uma narrativa que ignorava os avanços do filme de Johnson e que, por isso, acabava completamente insossa e ilógica.
O meu conforto é saber que nada é para sempre. Que as coisas vão mudar. Que isto é uma fase, uma fase cujas nuances os grandes estúdios ainda estão penando para controlar. Não vão controlar, mas poderão compreender. E o primeiro passo para isso é fazer o impensável: dar um pouco de costas para o grande público e deixar que os artistas trabalhem. O Liga da Justiça de Snyder prova que a visão do artista nunca será superada pelas ideias de um grupo de poucos produtores, ou por ideias de um grupo de muitos acionistas, sequer por ideias de um grupo de número infinito de fãs. Estas séries, com estes grandes nomes, aguentam uma ou duas derrapadas, talvez até mais. Elas aguentam, financeiramente falando, pois possuem números absurdos de públicos fiéis. Não valem o sacrifício de um artista, mas quando os estúdios permitirem que sejam veículos de expressão individual, além de veículos para lucros infindáveis, eles mesmos, os estúdios, é que sairão ganhando, pois estarão construindo mais do que séries bilionárias: estarão construindo um legado de qualidade que gerará a venda de cópias em DVD, Blu-Ray, streaming, e seja lá o que mais, até que esteja findo o planeta Terra, ou até mesmo depois disso.
domingo, 2 de janeiro de 2022
sábado, 1 de janeiro de 2022
2022
Que, além de paz e saúde, todos tenhamos tempo de sobra para nossos hobbies mais queridos. No meu caso, muito Atari e muito Master System.