A pequena olhava para o céu estrelado através da janela de seu quarto. Sempre gostou das estrelas. Mas mesmo elas, com toda a beleza que exibem, não podiam abafar os gritos de seus pais brigando no quarto ao lado. Para isso, a menina tapou os ouvidos com suas mãozinhas. Ao invés de encobrir os gritos, no entanto, este ato só fez ela sentir-se mais prisioneira.
Olhou para as estrelas e decidiu. Iria em direção a elas, fugindo do barulho mais que incômodo de seus pais. Pegou um agasalho em seu guarda-roupas e saiu sem fazer barulho. Pouco a pouco, conforme a distância entre ela e sua casa aumentava, ia respirando com maior tranquilidade. Checou novamente se as estrelas a acompanhavam, e lá estavam elas.
Era quase Natal. Numa rua comercial, uma loja abrigava um Papai Noel. A menina foi atrás dele, entrando na loja, à procura de doces, pois a fome já começava a incomodar. Não, ela não foi atrás de presentes. Já sabia que não existe Papai Noel e que aquele era só um homem numa fantasia. Entrando ao mesmo tempo que ela, um sujeito com a barba por fazer e vestindo roupas encardidas.
_Isso é um assalto!
Pânico. Pessoas correndo. O caixa de mãos erguidas. A menina, assustada, tropeçou. Não via mais o homem vestido de Papai Noel. Só via pés que se movimentavam rapidamente. E ouvia sirenes que se aproximavam. Alguém chamara a polícia. O homem mal vestido começou a gritar com alguém. A menina começou a se levantar. O assaltante passou por ela, em direção ao fundo da loja. A polícia chegou. Tiros. Barulho. Será que o barulho vai perseguir ela em qualquer lugar onde esteja? Dor. Tontura. Vermelho, há vermelho por toda parte. A menina desmaia.
O tempo fechou, apagando as estrelas. Chegara o Natal. O casal brigava por culpa do dinheiro. Da falta dele, na verdade. A discussão de ontem, que continuava hoje, era por isso. Discussões anteriores existiram por dezenas de outros motivos, de bebidas a possíveis traições. Umas interrompidas por falta de argumentos, outras pelo sono, outras por simples preguiça. Esta, entretanto, foi interrompida por um telefonema. Era do hospital. E dizia que a filha única dos jovens outrora enamorados havia sido baleada.
A nova discussão que ameaçou se formar foi abafada por desespero, histeria e pranto. Não adiantava debater quem era culpado. Desespero, histeria e pranto também nada adiantavam, mas ao menos consolavam. O casal buscou as estrelas, mas nuvens densas já as encobriam totalmente.
Assim, a noite de Natal passou-se no hospital. A princípio com um andar descontrolado e nervoso. Depois, com um cavalgar explosivo, que não durou. E, por fim, com lentidão e sofrimento. Um abraço nasceu ali. Num local tão pálido, tão gélido. Tão próximo da morte. Tão carente de amor.
Uma estrela despontou com o abraço. Não qualquer estrela. Uma que brilhava com maior intensidade. O médico veio e disse que outra cirurgia era necessária, mas que a garotinha estava agora mais longe do perigo, ainda que a nova cirurgia fosse um tanto delicada. O abraço tornou-se mais forte. E, naquele período de infinitas três horas e meia em claro na madrugada, tornou-se também mais quente. E transformou-se numa troca de olhares, cúmplices.
Nunca haverá estrela mais brilhante. E nunca haverá sorriso mais marcante do que aquele aberto, como um presente, para os pais. A menina vivia. Estava salva. Precisaria ainda passar um tempo no hospital, mas sobrevivera. Viveria? Esta é a pergunta que fazia a si mesma. E o apertar de mãos dos pais que recebiam seu sorriso com toda a gratidão do mundo era sinal mais que evidente de que sobreviver era coisa do passado. Hora de viver. Bem-vinda, vida!
4 comentários:
On qdo? Preciso desejar um bom natal p vc!!!! saudade.. saudade.. COMO ESTÁ SUA VIDA????
Ops, desculpe pelo off. Tinha um colega de Sampa aqui e fiquei batendo perna. Vida boa, apesar desse calorzinho irritante.
Ah, esse aqui ficou bem meloso, hein! Se fosse eu, já tinha matado a menininha e feito os pais se suicidarem na terceira linha! :p
Rimou! :):)
[]s
E o espírito natalino?
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